O papel dos blogs para informar sobre DII

O papel dos blogs para informar sobre DII

A palavra blog surgiu da contração dos termos em inglês web e log, que significam ‘diário da rede’. Desde que os primeiros diários surgiram de forma mais organizada, em 1999, milhares de outros foram sendo criados e, hoje, é possível acessar uma infinidade de informações na internet por meio desses canais. E foi exatamente para compartilhar conhecimentos como farmacêutica e experiências como paciente de doença de Crohn que Alessandra de Souza criou o blog Farmale.

A farmacêutica e mestre em Biociências Nucleares é membro da Biored Brasil e do Comitê Científico da Associação do Leste Mineiro de DII (ALEMDII), e atua como colunista do blog Artrite Reumatoide, do RecomeçAR/RJ e da Associação de Pessoas com Doenças Inflamatórias Intestinais de Santa Catarina (DIISC), além de ser parceira do projeto Gastronomia na Promoção da Saúde da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).[cs_divider size=”cstheme-shortcode” type=”line” color=”#f1f1f1″ height=”1px”]

Como surgiu a ideia de criar o blog Farmale?

Tenho diagnóstico de Crohn desde 2003, depois de dois anos sofrendo com sintomas. Nesse mesmo ano comecei o curso de Farmácia e surgiram algumas coincidências – acredito que já era um plano para chegar ao Farmale. No primeiro ano da UERJ passei para iniciação científica e lá, quando souberam da minha doença, falaram de uma pesquisa com pacientes com DII.

Conheci as doutoras Ana Braunstein e Ana Tereza Pugas e o doutor Flavio Abby, que colocaram meu tratamento nos eixos. Minha monografia foi sobre DII e, por coincidência, a minha orientadora, professora Lílian Faria, havia escrito sobre o mesmo tema e minha co-orientadora, doutora Ana Braunstein, foi minha médica. Fiquei bem por um tempo, porque a doença cursa com recidiva e remissão, mas o Crohn em mim é estenosante e não deu para escapar da cirurgia.

Minha filha tinha um ano quando passei por uma cirurgia de emergência que virou minha vida de cabeça para baixo. Não podia pegá-la no colo e isso foi terrível. Passei a ter medo de morrer e arrumava a casa de maneira que as pessoas pudessem cuidar bem da Sophia. Minha família, os amigos e médicos me ajudaram a sair dessa, pois eu precisaria de uma nova cirurgia. Fiz rejeição dos pontos internos e duas hérnias incisionais.

Lia sem parar sobre o tema, conversei muito com os médicos e a segunda cirurgia foi um sucesso. Aqui entra o blog. Depois do susto, senti uma vontade enorme de compartilhar com outras pessoas o que sabia como farmacêutica e como paciente, pois entendo que a falta de informação para profissionais da saúde e pacientes pode ser fatal.
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Quanto o blog tem sido útil para informar sobre DII?

Percebo o quanto o Farmale tem sido importante quando rece­bo mensagens de gratidão que me deixam muito emocionada. Médicos também indicam meu blog para pacientes e até encaminham alguns para eu ajudar mais de perto, o que demonstra confiança no meu trabalho. Tem uma coluna no blog chamada ‘Depoimentos’ que é sensacional no quesito conscientização e um local de alerta para profissionais da saúde enxergarem nos pacientes um ser humano em busca de respostas e de alívio.

Eu sinto, pelas mensagens, que o Farmale não é só um blog de informações, mas de acolhimento e empoderamento de pacientes e familiares. Não quero mais ver pessoas levando anos para conseguirem um diagnóstico ou sendo tratadas de maneira errada, como eu fui. Quem acompanha o blog divide comigo medos, dúvidas, situações que passam com profissionais da saúde. Aprendo muito com eles também e sou muito grata por isso.
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Quem mais procura as informações?

Pacientes, familiares de crianças e pessoas em busca de diagnós­tico pedem indicação de um centro especializado em DII ou de profissional experiente. Algumas vezes relatam sintomas para que eu indique um medicamento, mas oriento a buscarem o médico e alerto sobre os riscos da automedicação.

Um público­ muito presente são mulheres que desejam engravidar ou estão grávidas, que querem saber como foi minha gravidez e se sentem aliviadas com o que compartilho, pois é um dado da vida real. As mulheres querem saber sobre medicações e tratamento na gestação, cirurgias e alimentação.

O pessoal gosta muito também quando compartilho receitas, mas sempre procuro destacar que, mesmo não havendo uma dieta específica para DII, a participação do nutricionista é muito importante. Seguir dietas da moda ou de outros pacientes pode ser perigoso.
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Por que a troca de informação é tão imprescindível para pessoas que convivem com doenças crônicas?

Descobrir que terá de conviver com uma doença sem cura tira o chão, então, quando encontramos outras pessoas com a mesma doença é um alívio. O fato de as enfermidades serem pouco­ conhecidas, inclusive por profissionais da saúde, gera muita angústia, porque a pessoa não consegue ser ouvida com empa­tia.

Quando encontra outra em situação semelhante, isso é como um porto seguro. Nas trocas de informações, os pacientes compartilham seus médicos ou hospitais onde são atendidos, ajudando quem está buscando diagnóstico ou tratamento melhor. Isso também proporciona acolhimento, pois, às vezes, nem mesmo em casa o paciente tem com quem contar. Nessa jornada de paciente aprendi, com uma amiga querida e grande ativista na saúde, Priscila Torres, que informação é tratamento.
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Quais são as histórias mais relatadas no seu blog?

São histórias de medo. A demora no diagnóstico e no alívio dos sintomas, a falta de medicamentos – no caso da retocolite ulcerativa, eles não entendem porque não têm direito aos biológicos – faz com que os pacientes passem muito tempo em sofrimento e, às vezes, a doença é complicada mesmo de tratar.

Eles têm muito medo da cirurgia, da ostomia, dos efeitos das medicações, de câncer… São pessoas que precisam ser ouvidas por seus médicos, por outros profissionais, pela família e pelos amigos.
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Como o leitor pode selecionar o que encontra na internet para não seguir uma orientação equivocada?

Saber filtrar as informações é complicado e, em certos casos, pode ser impossível para um leigo. Verificar a credibilidade do conteúdo e das fontes é muito importante, a fonte de consulta­ tem de estar presente e sempre procuro deixar esse alerta nas redes sociais. Não estou ali atrás de likes, estou trabalhando o empoderamento do paciente para a promoção da saúde, levando­ informação para pessoas que têm uma doença séria e isso é de muita responsabilidade.

Boas fontes de consulta são aquelas indicadas pelo seu médico, sites de associações de pacientes,­ universidades, instituições da área da saúde, organizações como ABCD e GEDIIB. Mesmo com os perigos da desinformação promovida pelas redes sociais, a internet tem proporcionado que pacientes tenham acesso a informações médicas com grande facilidade, e isso pode melhorar a relação médico-pa­ciente, favorecendo o compartilhamento de decisões, o que também leva a uma necessidade de atualização desse profissional.

Já nos grupos, as trocas das vivências diárias com a doença ajudam muito aos que estão iniciando essa jornada. Quando surgem assuntos polêmicos ou soluções milagrosas, o pessoal mais experiente logo aconselha que o paciente nunca pare o tratamento, pois as consequências podem ser graves.
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Como a senhora concilia suas atividades e a DII?

Desde que a minha filha nasceu, não trabalhei mais em horário comercial, pois vivo a rotina dela. Quando não estou com ela, aproveito meu tempo lendo, escrevendo no blog ou para outras associações nas quais sou voluntária e ainda consigo um tempo para o balé e a academia. Estou em remissão desde 2013 e, com isso, exames e consultas são mais espaçados. Passei a utilizar somente uma medicação a cada oito semanas, o que deixa minha rotina com o tratamento mais tranquila.

Administro meu tratamento com dedicação, mesmo na remissão, porque o controle tem de continuar para não ter surpresas desagradáveis. Confesso que gostaria de ter um posicionamento mais relaxado com a doença, mas, depois que tive minha filha, a responsabilidade dobrou. O cuidado que eu tinha com a aparência mudou, as prioridades são outras.

Faço musculação pensando na saúde dos meus ossos, balé e alongamento para melhorar a minha postura e sintomas reumáticos, pois o foco não é mais a estética, e sim a qualidade de vida. A alimentação também mudou, evito industrializados e me alimento com equilíbrio.
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Qual é o segredo para ter uma vida normal mesmo convivendo com uma doença crônica?

Aceitar, sem se tornar passivo. Aceitar é o grande passo para o sucesso do tratamento e a saúde mental, nos afasta do estresse e da ansiedade. Quando o paciente se permite conviver com a doença, sente-se responsável pelo sucesso do tratamento, melhorando seus hábitos alimentares e de vida. A rebeldia e a negação não combinam com o tratamento de uma doença crônica.

Pode doer muito se conscientizar disso, mas é importante e, quando existe muita dificuldade em aceitar, a indicação de terapia deve ser avaliada, pois as DII precisam de uma abordagem multidisciplinar. Ficar longe do sentimento de culpa também é muito importante. Devemos lembrar que as DII não têm causa definida, logo, nada do que fizemos foi o causador da doença.

John Doe
John Doe

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