Treinamento para manter a saúde

Treinamento para manter a saúde

Muito conhecida no esporte e no mundo corporativo, a pala-vra inglesa coaching (treinamento) recentemente passou a ser usada, também, na área da saúde. Cabe ao coach – ou treinador – ajudar as pessoas a entenderem melhor sua condição de saúde para buscar mais qualidade de vida.

A coach em saúde e bem-estar Daniele Kallas, certificada pela Wellcoaches School of Coaches, dos Estados Unidos, mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coordenadora do curso de formação em coaching de saúde e bem-estar no Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo, explica nesta entrevista como o treinador pode facilitar a busca por um caminho mais saudável e feliz.

Como atua um coaching na área da saúde?

O coach em saúde e bem-estar atua como um facilitador da mudança e apoia o cliente para que descubra a melhor maneira de realizar as mudanças necessárias para uma melhor saúde a partir de seus valores e crenças.

O coach em saúde também atua facilitando processos de mudança para doentes crônicos que, muitas vezes, têm de adaptar seu estilo de vida em função de uma enfermidade e não sabem por onde começar.

A atuação pode acontecer para mudanças em atividade física, alimentação, gerenciamento de estresse, sono e saúde emocional, dentre outras áreas relacionadas ao bem-estar e à saúde.


Quando surgiu essa modalidade de trabalho?

Nos Estados Unidos, o coaching em saúde já existe há mais de 10 anos e surge como uma complementaridade ou alternativa efetiva para engajamento em novos hábitos de saúde ou para a cessação de hábitos não saudáveis.

O coaching em saúde busca seus referenciais teóricos em várias abordagens e teorias da psicologia, da enfermagem e de outras áreas, como entrevista motivacional, modelo transteórico, psicologia cognitiva comportamental e comunicação não violenta. Várias dessas abordagens surgiram para lidar com a resistência nos processos de mudança, algumas em especial com foco no tratamento de problemas como álcool e drogas.

Fiz minha formação em 2010 e, nessa época, ninguém falava ou conhecia o coaching em saúde no Brasil. Desde então, a área vem se desenvolvendo e mais pessoas estão sendo formadas. O curso de formação no Hospital Alemão Oswaldo Cruz está na segunda turma e o coaching em saúde é cada vez mais bem recebido no meio médico. Há cerca de seis anos, um grupo de escolas formadoras nos Estados Unidos se organizou para, de alguma forma, encontrar uma definição comum e parâmetros para a intervenção conhecida como coaching de saúde e bem-estar.

Foi criado, então, o National Consortium for Health & Wellness Coaching, que passou a publicar diretrizes, consensos e, em setembro de 2017, realizou a primeira prova de certificação nacional norte-americana. O Consortium atuava apenas nos Estados Unidos, no entanto, recentemente transformou-se em internacional, indicando que será uma instituição de referência para acreditação de boas escolas formadoras e certificação de coaches.

No Brasil, apoiamos o coaching de qualidade a partir das referências científicas e seguimos as recomendações éticas de atuação profissional da Federação Internacional de Coaching (ICF).


Qual é o principal objetivo do coaching em saúde?

O objetivo de cada processo é sempre autodeterminado pelo cliente. No entanto, alguns objetivos comportamentais são fundamentais, independentemente da mudança desejada pelo cliente ou paciente. Um deles é a crença de autoeficácia, crença individual de que a pessoa é capaz de realizar mudanças.

Em coaching, um aumento da autoeficácia é um grande resultado, pois coloca o cliente na direção e no movimento para a mudança. O aumento do nível de consciência, a percepção de si mesmo, de seus hábitos e das suas escolhas diárias é fundamental para que, aos poucos, as tomadas de decisão sejam mais saudáveis e responsáveis. Ao final de um processo de mudança, os clientes com maiores níveis de autoeficácia e de autoconsciência serão os que sustentarão suas mudanças em mais longo prazo.

O treinamento ajuda tanto os profissionais da saúde quanto os pacientes?

O coaching de saúde e bem-estar tem foco no cliente final, seja um paciente ou uma pessoa que deseja mudar seus hábitos para ser mais saudável. Os profissionais da saúde também podem ser clientes de coaching, desde que desejem trabalhar projetos pessoais de saúde e bem-estar.

Se o profissional da saúde está em busca de reflexões e aprendizagens sobre sua carreira e escolhas profissionais, o coaching de saúde não é o indicado e deve-se recorrer, neste caso, a um coaching de carreira/executivo.


De que maneira o coaching pode ajudar as pessoas a terem uma vida mais saudável?

O coach trabalha em um processo de relacionamento que dura de três a seis meses, em média. Neste tempo, cliente e treinador irão se encontrar em sessões de 30 a 60 minutos para desenhar uma visão de bem-estar, ajudar o cliente a identificar seus valores e forças pessoais e trabalhar um objetivo inicial para esse projeto. A cada encontro são discutidas as metas realizadas, as aprendizagens do processo e as soluções para dificuldades encontradas no caminho.

Costumo dizer que o coach é um facilitador do diálogo do outro consigo mesmo, pois, por meio de perguntas, ajudamos nossos clientes a fazer descobertas significativas sobre si mesmos. Entendo que o coach ajuda as pessoas a terem uma vida mais saudável, pois não diz ao outro o que fazer, mas o ajuda a descobrir o melhor caminho e as melhores ferramentas para seus objetivos. É um grande processo de empoderamento para o cliente.


Estimular as mudanças de hábitos e comportamentos é a tarefa mais difícil para um coach de saúde?

Trabalhamos com mudança de hábitos o tempo todo e, talvez, o desafio esteja na complexidade do hábito. A adoção de hábitos saudáveis, muitas vezes, é mais simples do que a cessação de hábitos nocivos como, por exemplo, o tabagismo.


Quais são as técnicas usadas para atingir os objetivos?

O coach atua a partir de conversas, criando um ambiente seguro e sem julgamento. Desta forma, quando fazemos boas perguntas as pessoas têm espaço para explorar novas possibilidades, experimentar estratégias e aprender sem o medo de falhar. Mais do que técnicas, um bom coach deve ter boas competências de escuta, presença, empatia e saber fazer boas perguntas abertas.


O coach de saúde tem um programa comum ou desenvolve estratégias específicas para cada ‘aluno’?

O que pode ser comum é a metodologia, o uso das competências do coach, mas cada pessoa faz seu próprio projeto, de acordo com sua visão e desejo de mudança. Algumas ferramentas e avaliações podem ser comuns, como uma roda da saúde ou avaliação de estilo de vida, mas cada pessoa irá fazer a sua interpretação e leitura do processo de maneira diferente.


No caso de pacientes com doença crônica – a exemplo das doenças inflamatórias intestinais – como seria o trabalho de coaching?

O papel mais importante é ajudar esse paciente a aderir ao tratamento para que o mesmo seja eficaz. No caso das doenças inflamatórias intestinais pode-se trabalhar um projeto bem particular voltado à aderência ao tratamento e a uma alimentação adequada, por exemplo, mas também se pode trabalhar a gestão emocional da doença e do estresse relacionado. Um artigo recente (Panés, J et al., 2014) indica que o coaching e outras ferramentas que melhorem a autogestão do paciente em relação à sua doença podem ser de grande contribuição.


Em sua opinião, quais são os caminhos para ter uma saúde plena?

Entendo a saúde a partir da perspectiva sistêmica. Capra (1980) define saúde como ‘um equilíbrio dinâmico entre os aspectos físicos e psicológicos do indivíduo na sua relação com seu ambiente social e natural’. Nesta perspectiva, o autor nos fala que a doença é um convite criativo da vida para buscar compreender sobre nossos desequilíbrios e, a partir daí, podermos atuar sobre eles.

Gosto muito deste olhar e entendo que os caminhos para a saúde plena incluem fortemente o autoconhecimento, viver uma vida com propósito e significado e ser capaz de fazer escolhas diárias que representem bem-estar. O maior presente que recebi e recebo diariamente no meu trabalho é ver as pessoas se tornando mais amorosas e responsáveis consigo mesmas, muitas vezes, encontrando propósito e seguindo saudáveis a partir desse novo local de estar no mundo.

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John Doe

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