Especialistas orientam como buscar informações de saúde na internet de forma segura e confiável
Atualmente, 3,2 bilhões de pessoas no mundo têm acesso à internet diariamente e a grande maioria utiliza a ferramenta de busca Google como forma de acesso a informações sobre os mais diversos assuntos e interesses. Um desses assuntos é a saúde e, neste aspecto, é preciso usar o máximo da racionalidade para fazer as escolhas corretas, uma vez que existem milhões de sites, blogs, vídeos e informações que nem sempre tratam o tema com a devida responsabilidade. Em contrapartida, também há inúmeras comunidades virtuais que abordam assuntos sobre doenças específicas – como o site da ABCD, por exemplo – e, com isso, oferecem suporte relacionado, principalmente, ao autocuidado, o que ajuda muito a todos aqueles que precisam conviver com uma doença crônica.
A busca por informações de saúde na internet não é um fenômeno recente e, no Brasil, começou com a implantação da banda larga, em 2009, quando a população passou a ter acesso facilita-do à rede mundial de computadores. O professor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), Paulo Roberto Vasconcellos Silva, pesquisador da área de Comunicação e Saúde do Laboratório de Inovações Terapêuticas, Ensino e Bioprodutos do Instituto Oswaldo Cruz/Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e do Instituto Nacional de Câncer (INCA), lembra que o maior risco da busca de informações na internet envolve a parcela da população que encontra dificuldades no acesso aos serviços de saúde – públicos ou privados –, o que faz com que parte do conteúdo disponível na rede seja uma fonte para usos indevidos.
“Essas pessoas podem ser vítimas de aproveitadores, de indivíduos que querem vender produtos ou que passam a impressão de uma determinada gravidade naquele sintoma para se beneficiar de alguma forma”, adverte. Além disso, há muitas pessoas que buscam a informação na internet e só usam aquela que mais agrada. Com isso, conseguem uma espécie de benefício, uma recompensa que precisam no momento de uma necessidade aguda ou crônica, como é o caso da descoberta de uma doença grave, por exemplo. Para o médico, a partir daí o indivíduo corre o risco de trilhar por caminhos tortos, pois se sente ‘empoderado’ pelas informações, que não necessariamente vão ser boas.
O médico psiquiatra Vladimir Bernik, coordenador da equipe de Psiquiatria do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo, acrescenta que o principal perigo da busca indiscriminada por informações de saúde na internet é o acesso a sites que não são idôneos ou que sugerem tratamentos alternativos, o que pode fazer o indivíduo desviar-se do tratamento correto para experimentar outras terapias sem supervisão médica. “O melhor caminho sempre é, quando houver necessidade de informação, buscar ajuda médica. Mas, se o indivíduo ainda assim quiser pesquisar sobre sua doença na internet, deve buscar informações apenas em sites idôneos e oficiais”, acrescenta.
Outro problema de utilizar o Google para fazer um ‘autodiagnóstico’ é que algumas pessoas podem achar que estão mais doentes do que realmente estão ou mesmo que têm uma enfermidade que sequer existe. “Os profissionais da saúde conseguem dimensionar adequadamente o diagnóstico e o tratamento para cada paciente, baseados no exame físico e em exames complementares, que o paciente sozinho não consegue fazer”, reforça o psiquiatra Vladimir Bernik. Além disso, em alguns casos a informação digital pode interferir na própria relação médico e paciente, pois não orienta de forma suficiente.
Uma informação incorreta pode desvalorizar ou supervalorizar tratamentos, e ambas as situações são erradas. O paciente deve ser orientado de que o tratamento sugerido pelo seu médico é individual e adequado para suas necessidades, enquanto na inter-net há uma informação geral que não se encaixa para todos os casos. Para o médico psiquiatra Vladimir Bernik, buscar informações sobre doenças é saudável desde que a pessoa, a partir da informação, procure um profissional da saúde e busque o tratamento adequado.
A internet também pode ser considerada um instrumento a mais para os pacientes adquirirem informação, além da que recebem dos médicos, segundo o psicanalista Francisco Daudt. No entanto, é preciso ficar atento para que isso não se torne um hábito que leve ao abandono dos tratamentos. “Há um aspecto benéfico dessa interferência, que é a defesa do consumidor de informação de saúde. O médico precisa estar mais próximo do paciente, menos dependente da inquestionabilidade de sua palavra, mais disposto a dar explicações sólidas. Sabemos que o paciente pode conferir aquilo que ouviu na consulta e perguntar sobre dúvidas que apareceram a partir da pesquisa”, argumenta.
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Laço de confiança entre paciente e profissional da saúde é fundamental
Os especialistas argumentam que também é fundamental que seja estabelecido um relacionamento de confiança entre profissionais da saúde e pacientes, para que as consultas à internet, se ocorrerem, possam ser usadas como forma de troca de informações. “Os médicos devem recomendar aos pacientes não usar a internet para averiguação dos sintomas até o fechamento do diagnóstico e estabelecimento de uma linha de tratamento. É fundamental estabelecer esse critério de confiabilidade entre médico e paciente”, enfatiza o psiquiatra do Hospital Oswaldo Cruz, Vladimir Bernik.
Durante as aulas de Bioética e Ética Médica na UniRio, o professor Paulo Roberto Vasconcellos Silva, responsável pela disciplina, discute muito com os alunos de Medicina a respeito dos pacientes que procuram o Google para ter informações sobre suas doenças. Para o docente, se depois de ser atendido por um médico o paciente voltar com conclusões do Google, alguma lacuna pode ter ocorrido na consulta. “É possível que o paciente queira cercar-se de todas as evidências, acabe se confundindo com o que encontra na internet e volte ao profissional da saúde para esclarecer suas dúvidas; ou o profissional não conseguiu suscitar confiança, não conseguiu desenvolver um vínculo forte o suficiente de confiança para que este paciente se sinta seguro sem precisar consultar a internet”, avalia o médico.
Quando o profissional consegue desenvolver um laço de confiança forte e estruturado o suficiente, o paciente não terá necessidade de buscar outras fontes de informação, mas, para isso, é importante que tudo o que o paciente trouxer na consulta seja comentado e validado. “Desta forma, não haverá um ambiente de confrontação. Mas essa conduta depende muito do grau de confiança que o médico consegue cultivar no seu relacionamento com o paciente”, sinaliza. O professor da UniRio ressalta, ainda, que se hou-ver uma boa relação entre médico e paciente, independentemente da enfermidade, o doente pode até buscar informações na internet, mas vai levar essas informações para a consulta e ocorrerá uma troca. Agora, quando vai para a internet e desconfia do médico, efetivamente é porque não se sentiu seguro com a consulta. Neste caso, cabe aos médicos darem um pouquinho mais de atenção aos seus pacientes.
Foto: pixabay