Por Rosiane Mattar
*Professora titular do Departamento de Obstetrícia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), presidente da Comissão Nacional de Educação (CNE) de Gestação de Alto Risco da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo)
As pacientes com doença inflamatória intestinal que pretendem ter filhos costumam ter muitas dúvidas em relação à gravidez, especialmente no que diz respeito aos medicamentos. Entretanto, com alguns cuidados e acompanhamento de especialistas, é possível realizar o sonho de ser mãe sem grandes riscos.
A primeira atitude é planejar a gravidez para o período em que estiver em remissão da doença. O melhor momento para engravidar é até 35 anos de idade, com doença fora de atividade e com a menor dose de medicamentos possível.
Os médicos têm a obrigação de explicar que a mulher tem a capacidade de engravidar conservada, mas não deve engravidar com a DII em atividade e, para isso, precisam disponibilizar os métodos contraceptivos adequados a essa paciente.
Também é importante que a paciente esteja com o peso adequado, sem desnutrição e sem anemia, e que receba suplementação de ácido fólico no período periconcepcional, de preferência iniciando dois a três meses antes de liberar para engravidar.
Nas mulheres em tratamento com esteroides, devemos tentar entrar na gravidez com a menor dose possível do medicamento e suplementando cálcio e vitamina D para prevenção de perda de massa óssea.
Na gestação, a suplementação de ferro é mais importante ainda, tendo em vista a elevada prevalência da anemia nas pacientes com doença de Crohn, que tende a se acentuar na gravidez.
Parece que a gravidez não modifica o curso da DII, mas existem estudos que mostram que cerca de 2/3 das pacientes com doença ativa na concepção têm atividade persistente da enfermidade durante a gravidez, enquanto só 1/3 das pacientes com doença fora de atividade na concepção experimentam crise durante a gestação.
Também existem relatos de que, havendo atividade da doença no momento da concepção e durante a gestação, há aumento na chance de ocorrer aborto espontâneo, prematuridade, restrição de crescimento intrauterino e baixo peso do bebê ao nascimento, além de óbito fetal intrauterino e maiores índices de parto cesárea.
Embora já tenha havido preocupação com alterações congênitas, os últimos estudos não encontraram associação com malformações congênitas do feto e doença inflamatória intestinal.
Durante a gestação, o ideal é evitar ministrar qualquer medicamento, sempre que possível. Mas, quando for necessário, os medicamentos devem ser utilizados para que a doença fique estabilizada e para manter a gestação, além de diminuir os riscos para o concepto.
Jamais se deve deixar de tratar a doença para evitar danos ao concepto, pois a própria doença causará esses danos. Para isso, procuramos utilizar os medicamentos que sejam classificados pela
Food and Drug Administration (FDA) – a agência federal do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos, uma das mais respeitadas do mundo em aprovação de medicamentos – como A, B e, se necessário, os de classe C.
Os medicamentos mais utilizados são derivados 5ASA, corticoides, azatioprina e anti-TNF. Recentemente, o uso de certolizumabe pegol na gravidez foi classificado pela FDA como Categoria B. Já as mulheres submetidas a tratamento com biológicos devem ser orientadas da necessidade de interromper o tratamento no final da gestação.
É importante lembrar que mulheres ostomizadas têm riscos maiores de desnutrição e de complicações inflamatórias e no momento do parto, que deve ser sempre de indicação obstétrica.
No entanto, sempre que possível, deve-se dar preferência ao parto normal, sendo importante o preparo do períneo durante a gestação por meio de fisioterapia perineal. Apesar disso, devido à presença de lesões anorretais e de complicações da vitabilidade fetal, existe maior risco de haver indicação de cesárea.
Independentemente de qualquer intercorrência, para que a gestação tenha um curso favorável é importante que ginecologista, coloproctologista ou gastroenterologista conversem para darem uma melhor orientação às gestantes, que também devem ser orientadas a amamentar.