Perda óssea pode ficar maior devido à DII

Perda óssea pode ficar maior devido à DII

Problema tem relação com fatores como idade, má nutrição, baixa absorção de vitamina D e cálcio, inatividade e corticoides

Estimativas indicam que de 30% a 60% das pessoas com doença de Crohn ou retocolite ulcerativa têm densidade óssea abaixo da média. Entre as causas estão idade, má nutrição, má absorção de cálcio e magnésio, ingesta deficiente de cálcio e deficiência de vitamina D. Outros fatores, como uso de corticoides, falta de atividade física e desnutrição também estão relacionados com a ocorrência de osteopenia ou osteoporose em indivíduos com doenças inflamatórias intestinais.

Além disso, as alterações inflamatórias sistêmicas presentes em pessoas com DII, que se associam a aumento da produção de citocinas osteoclásticas – substâncias produzidas quando há inflamação que podem ocasionar destruição do tecido ósseo –, e o estado nutricional comprometido em pacientes com perda significativa de peso contribuem para o problema.

Tanto pacientes com doença de Crohn quanto aqueles com colite ulcerativa apresentam mais risco de desenvolver doença óssea metabólica quando comparados com pessoas saudáveis. No entanto, há evidências de que os pacientes com Crohn apresentam frequência um pouco maior do problema.

“O comprometimento ósseo pode ser detectado, ainda, naqueles pacientes com doença de Crohn em que há acometimento de extensão considerável do intestino delgado, com consequente prejuízo à absorção de cálcio e de vitamina D”, argumenta o professor doutor Luiz Ernesto de Almeida Troncon, titular do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) e coordenador do Ambulatório de Doenças Inflamatórias Intestinais do Hospital das Clínicas da instituição.

Isso pode ser devido ao fato de pacientes com doença de Crohn poderem ter acometimento do intestino delgado afetando a absorção de nutrientes e, também, maior comprometimento do estado nutricional, diferentemente dos indivíduos com colite ulcerativa. Para a médica Clara Maia Bastos Lírio, professora adjunta do curso de Medicina do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), as DII em geral e, em particular, a doença de Crohn, podem levar à deficiência de cálcio, fósforo e vitamina D e, portanto, estão listadas entre as causas de osteomalácia.

“A osteomalácia ocorre devido ao prejuízo da mineralização óssea, um processo que depende de oferta adequada de cálcio e fósforo absorvidos pelo intestino sob influência da vitamina D. Portanto, sempre que ocorre deficiência grave de um ou mais de um desses componentes pode surgir prejuízo da mineralização”, complementa o professor doutor Francisco José Albuquerque de Paula, responsável pelo setor de doenças osteometabólicas da Divisão de Endocrinologia e Metabolismo do Departamento de Clínica Médica da FMRP-USP e diretor científico da Associação Brasileira de Avaliação Óssea e Osteometabolismo (ABRASSO), sociedade multiprofissional voltada para incentivar o estudo e a educação em doenças osteometabólicas.

Autora do estudo ‘Avaliação da densidade mineral óssea em pacientes com doença inflamatória intestinal’, a médica gastroenterologista e endoscopista Fabiana Lora, do Hospital São Vicente, em Curitiba, Paraná, ressalta que indivíduos com DII são mais propensos a desenvolver deficiência de vitamina D, porque a absorção é feita no intestino delgado e, portanto, tanto a inflamação quanto a ressecção de segmentos deste órgão podem determinar redução da absorção.

“Os corticoides também alteram e diminuem a absorção da vitamina D e do cálcio”, acentua. Intolerâncias também são comuns em pacientes com DII, inclusive à lactose, pois, como já possuem alteração na absorção do cálcio pelo intestino, a má nutrição com redução da ingesta de leite e derivados pode agravar ainda mais o risco de perda óssea.

No entanto, não é o tipo de doença que aumenta a chance de desenvolvimento de osteoporose, mas outros fatores, como a idade de início das manifestações e resposta ao tratamento. Segundo o professor doutor Claudio Coy, titular da disciplina de Coloproctologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM-Unicamp), deve-se lembrar que, quanto mais jovem, maior o tempo de exposição ao processo inflamatório e, consequentemente, maior risco de desenvolvimento de distúrbios ósseos.

“O controle clínico obtido pelo uso de esquemas terapêuticos eficazes é muito importante, pois associa-se com melhor absorção intestinal, menor perda proteica e melhor resposta ao uso de suplementos. Assim, sempre é bom levar em consideração a importância da adesão ao tratamento por parte dos pacientes”, argumenta.

A literatura indica que parece não haver diferença na prevalência da baixa massa óssea em homens e mulheres com DII. No entanto, a professora Clara Maia Bastos Lírio lembra que é possível que exista, dentre as mulheres com DII na menopausa, maior frequência de pacientes com baixa massa óssea em relação aos homens com doenças inflamatórias intestinais, devido ao efeito adicional da baixa produção de estrógeno nesta fase, assim como ocorre com mulheres saudáveis.

Também é de amplo conhecimento que, sem fatores de risco associados, as mulheres no período pós-menopausa têm maior ocorrência de osteopenia ou osteoporose em relação aos homens. “Porém, homens com DII não devem ser negligenciados em relação à necessidade de investigação, assim como de tratamento”, orienta o professor Claudio Coy.

Prevenção

A Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR) recomenda a prevenção e a detecção de distúrbios de densidade mineral óssea baseadas nas diretrizes existentes, sendo recomendadas após 65 anos de idade para mulheres e 70 anos para homens. Porém, para indivíduos com maior risco, a atenção deve ser feita independentemente da idade.

A investigação é recomendada para todos que fizerem uso de corticosteroides, especialmente para pacientes que usaram por mais de três meses de forma consecutiva. Os pacientes também devem ser incentivados a praticar atividade física e exercícios es-pecíficos que melhorem a propriocepção e diminuem o risco de quedas, além de fazer a reposição de vitamina D e de cálcio ou usar medicamentos eficazes na prevenção e no tratamento da perda óssea.

“A atividade física, principalmente musculação, é recomendada para a prevenção e o tratamento da osteoporose, embora existam controvérsias em relação ao tipo e à intensidade dos exercícios para que se obtenha o melhor resultado. Atividades específicas podem contribuir para melhor mobilidade e diminuir o risco de quedas e, consequentemente, de fraturas”, ensina o professor Claudio Coy.

Os profissionais que cuidam de pacientes com DII também podem ajudar a minimizar o risco de perda de massa óssea diminuindo o tempo de uso dos corticoides, quando estiverem indicados; orientando no sentido de evitarem restrições alimentares desnecessárias, como a suspensão de alimentos lácteos; e estimulando a exposição à luz solar para produção natural da vitamina D pela pele.

O professor Luiz Ernesto de Almeida Troncon afirma que em pacientes com DII, assim como em outros grupos que podem ser afetados, em geral a osteoporose não tem manifestações clínicas, exceto por eventual queixa de dor lombar. As fraturas, na maior parte das vezes, também costumam ser assintomáticas e, em muitos casos, acabam descobertas por acaso em exames de imagem, sendo mais comuns na coluna vertebral.

“A perda de massa óssea é uma alteração silenciosa, que só causa sintomas quando ocorrem complicações, como no caso das fraturas. Os sintomas serão determinados pelo local da ocorrência das fraturas”, complementa a médica Fabiana Lora.

No ‘Estudo da doença óssea metabólica em pacientes com doença inflamatória intestinal’, de autoria dos professores Clara Maia Bastos Lírio, Francisco José Albuquerque de Paula e Luiz Ernesto de Almeida Troncon, publicado na revista Osteoporosis International em 2017, o padrão de atividade física regular não mostrou correlação com a ocorrência de osteoporose ou osteopenia em pacientes com DII, embora esses pacientes exibissem níveis menores de atividade física regular do que os controles.

“Porém, é necessário ressaltar que o estudo mencionado não teve como objetivo avaliar, prospectivamente, a influência da prática de exercício sobre a manutenção da massa óssea. No entanto, a literatura médica mostra que a atividade física, principalmente a que envolve impacto, exerce efeito positivo sobre a massa óssea”, afirmam.

Além disso, a prática regular de exercícios melhora a capacidade física, aumenta a massa muscular, reduz o risco de queda e, consequentemente, de fraturas. Para os autores deste estudo, o paciente com DII deve se comportar como os demais grupos populacionais ou de pacientes com osteoporose e a prática de exercício deve ser estimulada sempre que as condições nutricionais e de atividade da doença permitirem.

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